O ROSTO DE MUITAS MÁSCARAS DE RICARDO PORTUGAL
um bom livro de poesia não acontece todo dia
raramente ele pipoca
no mundo underground dos poetas
que vivem como sóis anões
que alimentassem o interior da terra
neste mundo pós-catástrofe de ficção cientificíssima
surge um rosto de muitas faces
a traduzir-se em poemas
Ricardo Portugal este já surgido aos poucos
e há bastante tempo
que cada vez mais insurgido se mostra em seu
“A face de muitos rostos” onde
virulenta cara dada a tapa
ataca a todos os donos do discurso oficial
os muitos 3 poderes da fala
e até aos poetas infiltrados em tais
populações de megafones
por vezes de fato sua poesia atenta a todas os ditames
básicos
de Ezra Pound
usa de máscaras não muito duras para proteger o rosto
da chuva de cusparadas que ela faria por merecer
se bem compreendida
se, pois afinal
a boa logopeia mesmo enformada
por um rol de regras extraído de tudo que tornou-se clássico
conforme o arrolado pelo mestre imagista/vorticista
supracitado
tal logopeia é sempre difícil de retraduzir-se
por um leitor acostumado às facilidades da vida
contemporânea
e “A face” de Ricardo é logopeia rebelde
como bem dirá no posfácio do livro
o poeta-crítico pugilista Ronald Augusto
num discurso uno que não nos deixa dúvida de que a face de
um ser único
parte de um todo que só é pleno nas muitas máscaras
portanto não existe senão como ficção
(e aqui nesta obra poderiam embasar-se os defensores de que
a poesia é ficção
embora existam muitas obras que demonstrem o contrário)
num discurso uno eu
vinha demonstrando
uma linguagem esquizofrênica se apresenta uma mescla
do kitsch em fragmentos de dizeres popularescos de natural
distorção fonética da língua oral
com os preciosismos linguísticos que levam Ronald Augusto a
lembrar-se do
sempre lembrado nestes casos
Odorico Mendes
é a velha salada tropicalista que mistura o kitsch a
vanguarda (tradição da ruptura) e a tradição (que sugere Pound cada um tenha a
sua)
de que somos filhos os poetas brasileiros da nossa geração
mas se logopeia
ainda a poesia poundiana de Portugal
não prescinde nunca da regra primeira do mestre
“Atente para o som”
os ritmos da fala embora às vezes envoltos por métrica
aparecem
e como no irônico “Visita ao museu”
algo entre cummings, Pound e o ar bufão de Oswald de Andrade
a fala oral comparece sólida mascarada num popular talvez
guerrilheiro
entrecortando-se ao dizer
o que é a verdadeira sintaxe da língua falada
um pouco de Guimarães Rosa e Manoel de Barros
enfim há um pouco de tudo que é bom numa poesia onde até
Lupicínio Rodrigues é citado desrreconstruído num nível que o músico da dor de
cotovelo jamais poderia supor
mostrando que o autor Ricardo vive numa trincheira entre
dois mundos
o do rio de sua aldeia e o Tejo
a jovem e já esfacelante Porto Alegre e principalmente a sólida
civilização milenar chinesa
sua poesia relembra quase nostálgica uma cidade que já não é
a sua
e desenha belas imagens à moda oriental inclusive olfativas
que ficam na memória do leitor
e que dão a Ricardo Portugal a medalha de
poundiano à milionésima de nossa aldeia-mor do sul do Brasil
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