Muita arte na rede Ello. Visualize:

Muita arte na rede Ello:

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

A mineração do eu no outro, longo poema de Solivan Brugnara. Mais um poeta que se considera engavetado na Internet.

Apresentação



    Poema em idioma “quedense”, de Solivan Brugnara, poeta de Quedas do Iguaçu, Paraná.  Dando continuidade real ao projeto dos mais programáticos poetas do modernismo brasileiro de 1922, buscando uma linguagem real, por tentativa de cópia do realmente falado. Porém, no ponto em que estamos depois de Simões Lopes Neto, Guimarães Rosa e Manoel de Barros (para alguns, simplesmente, Mané), de reproduzir a sintaxe da língua oral cotidiana e/ou popular, ou reproduzindo os mecanismos criativos da língua falada, como fazia já Guimarães Rosa e o faz Manoel de Barros.



             ***


A mineração do eu no outro

 
 
D’ia
 Trabaiei poco co pai dele, eu morava nas lonjuras
 dos canhadão do Mato Queimado,nos cafundó,
 uns arguere adiante donde o diabo perdeu as bota.
 Ia di a pé pra cidade, galo inda cantava,
 triste decha a roça,virava pra oia otra veis
 a veia co chimarão no rancho luniado de lanpião,
 e sumia na seração.
 Tinha de cruza quizaza, potrero, piranpera, pinherá,
 taguará de tudo quanto é lado pra chega na Queda.
 Daí dormia no patrão, nos fundão, na dispensa junto co traiedo,
 pertado, parecia té patente, briava de varejeira,
 eu dipindurava unas carça, japona, tudo ensacado
 no prego das lingüiça e ia pro serviço.
 A moradia era de pinhero prantado por graia azur,
 dubado de bosta de anta,mijo de tigre.
 Pinhero dos grande,unhava céu,
 florado muita pinha te se serrado.
 De frente da casa era cidade, tráis mato,
 te os passarinho erum deferente,
 pardar dum lado ,nos poste de luiz
 e canarinho dotro, nos matagar.
 Pra diante
 ia pras bodega,trabaia de bastece as tobata,os toreiro,
 nus domingo vê firme,nas matine do Mazzaropi,do Texerinha.
 Sábado pros baile ranca rabo, dança vanera, panha dos polaco
 corre das tiraiada.
 Nos fundo
 arma rapuca, roba mio, melancia.
 Sistia poco teve, oiá qui era benzida pelo Padre Sismundo,
 problema que invergonhava, vermeava de i na sala
 e do mais, na teve não tinha butiá, quero-quero nem lambari.
 Tinha a tar das novela e firme de tiroteio,
 de bichinho que falava.não gosto, mais o Soile gostava,
 tarde intera, despois pintava osso do peito
 de galinha e dizia que era nave espaciar azul.
 Bão também Jogava bulica, futebor nas estrada, nos campinho,
 voltiava de bicicreta, ia pega bergamota lá nos confins do Judá.
 Quando tinha pechada de carro, velório,
 baleado no samambaial, em bodega,
 um pia espaiava pro’tro e ião de turmada na novidade.
 Ate vaca morta cheia de corvo iam vê.
 Pia é bicho do jchãnho.
 Despois se pelava de medo de baleado parece de noite
 pegava a durmi só de luiz acessa.
 Te parece, luiz não espanta sombração,
 tem que faze benzimento, joga água benta pra resorve.
 Via lobisome,
 e oiá qui lobizome daqui não é bicho do brabo,
 chupa ovo, pega galinha manca, distrambeia na primeira acoada.
 Deve ser cruza de home com quaipeca manso, quaipecalome.
 Pra esses lado nunca vi fala de lobizome taca gente.
 Boitatá intão, qui nos canhadão, nois doma,
 usa pras lida,traze tropa de melore,da vortiada,
 faze pinhão no fogaredo da crina,
 pinhão mio só assado na grimpa.
 Que sombrava memo era a Kombi branca que seqüestrava,
 marava na soga, bem,dava nó,levava pra taquarazuzar,
 tirava as morcia, os bofe da piazada e vendia pros estrangeiro,
 despois atirava os guri no Iguaçu, na seva das traira.
 De visage, repiava a muié de seração que rodiava o cemitério veio.
 E otro qui de veiz em quando parece
 avoando na praça de buchada pra fora.
 Que dá tira desmata na sexta fera santa,dia de resguardo
 o pinhero caiu em riba dele qui istribucho.
 O Soile não queria sabe de i pra aula, burro que era uma anta,
 rodava, istudiava só na suiterada,no laço.
 O dele é cata fruitinha do mato, se metia nas capoira
 trais de sete capote,maria-preta,coquinho,ponta de grimpa verde.
 Tinha té carero pro vacum,tudo que male mar dava pra vê,
 tudo piqueno,vacum intão é pingo d’sangue.
 De boa jaracatiá,banana de mico, riticum, só no mais longe.
 Era mintiroso, mintiroso, gargantiava
 que tinha luitado cum jiboia numa quizaza de preá.
 Amostrava ranhado de taguaruçu e dizia que era dentada de onça.
 As veiz se fazia de índio, cum pena de carijó,
 se a negada do posto via, gozava,vinha de pedrada.
 Mais gostava memo era de gibi,
 ia pega na livraria do Seu João.
 Seu João tinha prédio bão, de primera,feita de materiá,
 teiado de ternite, teia é coisa veia, casa boa tem ternite.
 Tamanho de duas, uma cima dotra,
 baxo gibi,caderno,cima moradia,
 de zulejo bunito ,enfeitado de flor.
 De veiz eu garrava compra um caderno, mais nas vendaiada,
 Pra faze palhero, de foia caderno é mais atuar,
 inte parece cigarro da holiude.
 Seu João ensinava cartilha n’aula
 interigente, sabia das Bibria,dos jorna.
 Morada na bera da igreja.
 Igreja bonita,parecia com das Europias,das de foinha,
 co vermeio das chaga de Jesuis.
 Mais do longe, nem parecia se de anjico.
 Padre Sismundo, ia pras linha de matungo veio, cabado.
 Quele tempo, de tráis, nem tinha estrada,
 ia pelo carrero feito no fação pros interio,
 no caminho da onça, facir pisa em urutu,cascaver,
 tinha de travesa matagar do brabo, chegava ardido de urtiga,
 espinhado de cipó unha de gato, inchado de abeia.
 Hoje já tem condução tudo facir.
 Rezava missa bunita ,enveredava pros conseio,
 dava sermão pras muié que ia de saia curta pra igreja.
 que usavum islaque.
 Tinha ocurus de grussura,tanto lé, acho,cansa as vista.
 Assunta como se comprava ocurus d’grau.
 Ia na venda mió,maió, nas do Franzoni,
 lá tinha balaio de taguara cum monte de ocurus,
 escoia,ficava pondo e tirando dos óio té um acenta,
 té vê bem as coisa,se não nuviava mais as vista
 comprava,o Falecido pai comprava ansim.
 Então,vortando, o Soile garrava no gibi
 de veiz em quanto,eu zoiava um tar de Tequis,
 de outro, co de pitanga ,visage,
 alembrei Fantasma, prestado do Irson.
 Mais i os dele era outro,via os não seioquelá dos homeranha
 e saia luita com samambaia, mandioca, mata-campo,
 entrava só pra pega pão moiado com açúcar
 e gasosa Serramarte e vortava pras guerra.
 Eu tenho radinho, de prastico marelo bunito.
 Escuito futebor, jogo do inter ,violero, pograma de pulicia.
 Quando fui pra Sarto do Lontra passiá,
 toquei de compra na rodoviária um vrinho de fareste.
 Sabe que inte foi bão vé o vrinho,
 quando vortei deitei no pelego
 e oiei debaxo da cabriúva de carnea vaca.
 Mas não comprei mais,demais de caro,
 tinha que guarda pras pia.
 Tinha uns de muei pelada,de teta tudo de fora,
 escundi no paió, os rato roeram as mió parte.
 Desgraça de rataiedo.
 A mãe campeava se catasse ia pro fogo, virava lenha.
 O Soile
 parecia que nunca tava onde tava,
 na rede dizia que tava num caico
 e balangava inte no teto,
 o teto tinha mais pezada
 que a entrada da moradia.
 Subia no teiado,qui era a lua e despois.
 se destrambeiava de guarda chuva lá do arto.
 Oia,não sei como não se quebrava.
 Piá tem bicho carpintero no coro.
 A casa? era bunita, a dele, grande.
 Qui em Queda, eitá lugar de moradia tudo iquar,
 parece um c’otro,num tem sobrado cum sotam,nem porão.
 Tudo quanto é teiado abre asa pra direita, faze área.
 O gente pra gosta de uma área.
 “Entra” é só modo de dize, se traiz as cadera
 e as visita fica no fresco.
 Área é o abraço da casa,
 lugar de recebe os cunpadre, toma chimarão.
 Tem servendia de garage também,
 se chega a parentaida e só vastra o fusca.
 A moradia dos bonado são parecida, muda só tamanho
 ou feita de materiá, teido de ternite,
 mais o jeito é mema coisa.
 Otra deferença me toca dize
 é onde se pranta as pranta,
 samambaia, espada de São Jorge tudo mundo tem,
 só que nos de dinheiro é no vasos,
 as outra, dos minquera, é no galão de tinta Rene.
 A do Soile era de samambaia no vaso
 é rico é bicho fraco memo, bardoso
 o piazedo não gostava, decha de lado.
 No futebor parece chuta purungo,
 na bolica, não certa na caseada, no bulico,
 num sabe sorta pandorga fica distranbeiada,num avoa.
 Ai pegava de fica tempo enchaviado,
 cós sordadinho de paper tizorado, guerriando.
 Escuitava da porta dando tiro de metralhaiadora ca boca.
 te ingraçado vê, num dexava entra, de jeito manera.
 Ma lazerento de ruim memo era no bodoque.
 Veis co primo dele chego, fizero um de borracha cansada
 e forquia de basorinha, oia não prestava pra nada.
 E saíram campiá passarinho, não certaro um,
 daí, aresorverum de pega da gaiola
 o papagaio peito roxo da famia,
 cortaro as pena d’asa e sortaro.
 E dele que dele pedrada no coitado.
 truchero o bicho depenado
 pra mostra qui consequirum caça.
 Despois qui a Dona Tere discubriu
 que era o papagaio peitoroxo dela
 as piazada panharum, mais panharum
 de fica vergão nos lombo.
 Eu quando era novo,lá nos canhadão
 carpia as roçada debaxo de sor,
 o de friu de racha os beiço,a zorelha.
 Gostava de vê carro passa, corre di atrais,te não pude,
 despois ficava vendo os rastro dos peneu.
 Te cubria as marca cum foia de parmera
 pra dura mais,protege dos temporá.
 Ficava chola de mostra pros outro
 que passava artomover na nossa roça.
 Catava pedra caprixada pro bodoque
 e ia mira na pinha dos sabiá na amorera,
 no peito das juriti nos gaio da canafrista seca.
 Pegava passarinho de penca,perdoava nem curuira,
 bicho nanico,tem de se bão
 certa curuira é qui nem certa no zoio do boi.
 I pro rio pula de cipó na’qua, merguiá
 pesca,faze as sem-vergonhice.
 Sabe lambari? pexe prata e azur,
 piqueno ma bastante no Iguaçu tem de monte,
 pega facir,de barde, se joga quirela.
 Ma io o bão é faze lambari arecém pescado,
 numa fritada,mais radite e polenta,é de lambe os beiço.
 O probrema do lambari é queda brigaida de casar.
 Causa de Lambari oiei os tempo muda.
 Pra’onte inda, home pescava e muié limpava,
 hoje’dia, mudo, home não manda mais,
 por causa das novela da Grobo,sabe?
 Muierada ficam bizoiando as tar de novelas,
 daí prende das modernidades,já que trabaia fora.
 A minha qué por qué se zeladora da iscola Castro Arves.
 Hoje’dia o home tem que pesca e garra de tira buchada
 ainda frita, se muié toca de limpar, oia da desquite.
 E torresmo, eitá torresmo, de porco sorto,
 criado na lavage, de encraxa os bigode.
 Torresmo se escoie, garimpa o mais meio.
 Têm muito só graxa e coro duro
 de quebra dente do fundo, poco de carne,
 negocio é cata que rareia.
 Bão é co a companheirada de bodega, cum pinga,
 na torresmada tudo é iguar , não tem rico,
 cada que se ajeite pra acha pedaço que preste.
 Passa pra todu o mundo,
 garra um, ponha no sar co vinagre e pra dentro.
 Torresmo da problema de congistã,
 mas não é como outra, que quando torce as tripa,
 se pega nojo, torresmo despois de meiorá,
 já da vontade de novo, torresmo é assim.
 Na bodega vorta e meia parece arguém co torresmo,
 pra deixa os amigo contente.
 Vô pra bodega di as veiz, joga um pontinho,truco
 se esconde das tormenta.
 Que dia de chuva não da pra carpi,
 e dia de sor é de mais de quente,
 de esquenta a moringa.
 Lá dá pra pedi um galeto,ovo na salmora, paster
 pra come cum gasosa.
 Só não me vai pinga com mistura,
 O pessoar tem mania de estraga pinga
 cum gaio,cum quizaza,
 ponha mestruis, preteia com jaboticaba,
 marga com milome, doça com butiá.
 Me petece cachaça da pura, de lambique
 dose da boa,desse ranhando,de enguli gato de ré.
 Só tomo uma cum aio só guando me taca gripe,
 o cum losna pro estomego.
 Oia bodega não é só pra home,home fica,
 bebe, joga sinuca,baraio,faiz gritacera de truco
 fica ma moita no treis sete.
 Mais guri vai compra doce e sai.
 O Soile se cabava no doce, não pinchava chicrete fora,
 grudava o baita debaxo da mesa,punhava na geladera
 notro’dia pegava de vorta, pra masca de novo.
 Bodega se iscuita caso.
 Meu cumpadre conto que pesco onça.
 O home tinha pego baita pexe,
 não é de vê qui a pintada se taco na carpa-capim
 e o anzor fico prendido na boca dela, bandonei.
 Mataram o coitado do meu cumpadre.
 Se meteu numa tramóia,
 fizero espera na piramberra, perto do córrego.
 O capanga sabia o carrero da paca,atiro.
 Foi qui nem mata cateto do girau.
 Triste vê, cheio de bala, uma bem no zoio.
 Era bão, alembro bastante dele.
 Dia ele ia bebe uma pinquinha,dozinha,
 falei pra mangá
 -Não joga poco pro santo?
 num talagazo entorto tudo e prozeo
 - Não vô não, joga você que é infier,
 meu Santo mora qui dentro do meu peito.
 Eee sardade, vorti i meia penso nele,
 nois ia pesca,fumo caça,nos bailedo,
 se cabava no chote, cum ele não tinha tristeza.
 Se carniava porco,me dava um pedaço,do meió,
 mais umas vorta de lingüiça, se coiá borora trazia,
 Mandioca intão, de braçada, e quejo, mio verde,
 inte galinha limpa, cos miúdo tudo rumadinho no vazio.
 Foi coitado, dá nó no peito, paifioeispiritosantoamem.
 Vá cum Deus cumpadre,dia nois imo se vê.
 Eu não costumei na cidade, vortei pros canhadão.
 Gente vai pra cidade, só pra trupica,
 chupa picolé,perde lotação.
 Se crio no mato, no mato tem de mora,
 cuida da criação, pincha mio pras galinha,
 da gosto, vem tudo em vorta.
 Cria porco na lavage, tira leite da brasina
 e das veiz desenferruja a quarentinha
 nos cambuta, nas paca, nas pomba-carijó
 Pega quabirova e ovaia no potrero,
 sopra as bosta da vaca é manda pro bucho,
 Sai e vorta cós borso cheio de butiá,vida boa.
 Inte mais.