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segunda-feira, 5 de março de 2012

Poema de Material Móvil, 1993 Jorge Riechmann (Madri, 1962) - Tradução Adrian'dos Delima



Poema de Material Móvil, 1993
Jorge Riechmann (Madri, 1962)

 
 




 
    POEMAS PARADISÍACOS     *    

1.

A vida
rosário de instantes líricos.
A sociedade
uma congregação de manequins.
A economia o baile
dos vampiros.
O sonho circular percorrido saboroso
pelas estações da tortura.
A realidade um montão de escombros
radiantes nas telas de OiTV.

Comprovendo prontuários para estetas
(máxima discrição garantida)


2.
(Madri, agosto de 1987)

Toneladas de carne bem bronzeada
envolta em algodão de tons suaves.

Me repugnam os simulacros de inocência.


3.

Uma esquadrilha de anjos
atravessou de noite a barreira do som
bem perto da minha casa

Anjos
sua presença se torna
mais agourenta a cada dia

anjos de reconhecimento
anjos espiões
anjostanque
anjos bombardeiros
esquadrões de anjos paraísos voadores
seráfico câncer que arrebenta miriápode
sob a pele da noite
e voltam às suas bases

O general John Galvin declarou
que o acordo para a eliminação global
dos mísseis de alcance médio
pode implicar um risco excessivo.

4.

Me rodeia e me nina
com apalpos cálidos
e sedas tão suavemente coladas a meus membros.
Me injeta
o divino licor que me torna branco o sangue
com quelíceras de carinho afundadas no pescoço.
Delíquio ardente de minhas entranhas que se fundem
em um líquido extático
gulosamente sorvido pelo sonho.

Se trata do sonho
mais sedutor e amável
de quantos hoje riscam nossas brilhantes cidades multimídia.
Não serei eu quem se atreva
a romper o consenso
ou turbar com um não a paz do paraíso.

5.

Escrever era
conjurar
a força que traspassa homens bestas e astros
no colar tenso do cosmos.

Escrever era
orar
ao ser todopoderoso amante e terrível
a cujo olho ciclópico se torna impossível subtrair-se.

Escrever era
seduzir
com impudência goliárdica uma taberneira
com galharda ourivesaria uma cortesã
com pânico exultante uma deusa vingadora.

Escrever é
produzir mercancias.

Vaidade de seguir encapsulando
humanismo liofilizado em hendecassílabos
enquanto no entorno os guapos mortos viventes
meneiam epiléticos
o penúltimo cubalibre de césio e cicuta.
E é que eu sou, meu amigo,
daquela geração do paraíso.



Tradução Adrian'dos  Delima
















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